Os marajás do Estado e os do mercado financeiro, por Luís Nassif

Por Luis Nassif



Dia desses, uma notável economista, através das páginas do Estadão, conclamou a sociedade a investir contra os marajás do serviço público, que perderam o foco de sua missão, que é servir ao público.

Escrevi recentemente sobre a crise do liberalismo patrício, a incapacidade de casar o discurso da eficiência e redução do Estado, com um mínimo de sensibilidade social, solidariedade, generosidade, princípios legitimadoras de uma ação política. Enfim, mostrar que o modelo que defendem é mais eficaz que o modelo intervencionista na promoção da condição de vida da maioria da população.

Mas não conseguem deixar de olhar o próprio umbigo. Isto é, admitir as distorções amplas e óbvias no quadro fiscal, dos quais o mercado, associações de profissionais liberais e as diretorias das grandes corporações são os maiores beneficiários

Desde o governo FHC há uma lei que isenta tanto a distribuição de dividendos quanto os pagamentos feitos a título de juros sobre o capital próprio – uma distribuição simples de lucros, a título de pro-labore.

No fundo, a crítica ao Estado e aos salários dos funcionários públicos fica algo mesquinha, uma mera disputa pelo bolo orçamentário. Ou seja, a redução do custo do Estado não significará melhoria dos gastos que revertem diretamente para a população, mas garantir espaço fiscal para a ampla elisão fiscal que caracteriza o sistema brasileiro.

Tome-se a economista e sua instituição.
Cálculo 1 – a isenção fiscal com os juros sobre capital

Vamos comparar duas situações: um marajá do serviço público, alvo da economista; e um jovem analista ou operador de corretora.

O teto do funcionalismo – para aqueles funcionários com mais de 20 anos de carreira – é de R$ 35.000,00. Um procurador da República toma decisões que afetam toda a coletividade.

R$ 35.000 é um salário de quase iniciante no mercado financeiro. E a única função do operador é ganhar mais dinheiro em operações de arbitragem, e nenhuma responsabilidade mais ampla.

Compare o imposto de ambos, um pela tabela progressiva, outro pelo sistema de distribuição a título de juros sobre capital próprio.

Marajá

Mercado

Perdas

Renda mensal

35.000

35.000

IR mês

8.756

5.250

-40%

Ganho anual

455.000

455.000

IR Total

114.693

68.250

-40%

Ou seja, ganhando o mesmo que um funcionário público – ou um assalariado que pague pela tabela progressiva – o operador paga 40% a menor de Imposto de Renda.

E, mesmo assim, comparando com a tabela progressiva, cuja alíquota máxima é 27,5%, ínfima comparando com países desenvolvidos.
Cálculo 2 – a equiparação de IR entre o operador e o marajá.

Imagine dois casos: um salário pagando impostos pela tabela progressiva e outro pelo sistema de juros sobre o capital. Um salário de R$ 35.000 pela tabela progressiva paga o mesmo imposto que um salário de R$ 58.817 pelo sistema de distribuição a título de juros sobre o capital próprio.

Em cada exercício, o brilhante operador iniciante pagou R$ 45.473 a menos de IR – o que daria para sustentar 45 benefícios do Bolsa Família.

Nas faixas mais altas, a economia de IR para quem ganha R$ 178 mil daria para sustentar 148 Bolsas Família.

Salario PF

Equivalência

Perda fiscal

Bolsas Familia

35.000

58.817

45.573

45

40.000

67.983

53.698

53

50.000

86.317

69.948

69

75.000

132.150

110.573

108

100.000

177.983

151.198

148

Pergunto: sem abordar a questão da elisão fiscal no mercado financeiro, escritórios de advocacia, diretorias corporativas, dá para criticar o marajá o serviço público?

Só para os absolutamente desinformados. Informações Jornal GGN.