Poder público pode pedir fim de contratos com a Delta
Em meio à turbulência, a empresa pediu à Justiça do Rio de Janeiro na segunda-feira 4 a recuperação judicial para evitar a falência, alegando sofrer “bullying empresarial” pela conduta de alguns de executivos em supostos atos ilícitos. O caminho escolhido pela empresa, entretanto, aumentaria as chances de rompimento dos contratos com o poder público. Segundo analistas ouvidos por CartaCapital, o pedido deixa a cargo da administração pública romper acordos por incapacidade financeira da construtora,
algo pouco provável mesmo se a Delta fosse considerada inidônea pela CGU.
Em poucas semanas, a dona do maior número de contratos com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) passou de uma empresa com faturamento anual de 4 bilhões de reais e mais de 30 mil funcionários para uma estrutura desacreditada no mercado e rejeitada pelo grupo J&F, que desistiu da aquisição da companhia devido à exposição provocada pela CPI e a quebra do sigilo nacional da Delta.
O resultado é uma queda de 30% no fluxo de pagamentos por conta de atrasos e a possibilidade de recisões em massa de contratos com o poder público. “A lei não é específica neste caso. Logo, fica a cargo da administração pública verificar se há motivo para quebra unilateral”, explica Christianne de Carvalho Stroppa, professora da PUC-SP e especialista em licitações e contratos públicos. Segundo ela, os governos devem analisar os acordos individualmente e notificar a Delta a apresentar defesa. “A decisão final é do governo, município [contratante], mas a companhia pode recorrer na Justiça.” Enquanto a recuperação transcorre, a empresa é obrigada a manter a execução do contrato com todas as condições da licitação.
A construtora, que possui cerca de 4,5 bilhões de reais em 200 contratos públicos, tenta escapar de um processo de inidoneiadade da CGU que pode impedi-la de realizar novos contratos com o governo. Seria o fim de uma parceria extremamente lucrativa para a empresa. Por outro lado, ela ainda deve manter os contratos atuais devido a brechas jurídicas. Um cenário que ganha perspectiva diferente com o pedido da Delta, pois quando uma empresa é declarada inidônea, não tem condições ou estrutura de continuar executando um determinado contrato, argumenta Stroppa. No caso da recuperação, seria possível alegar que a Delta está incapacitada financeiramente de concluir todas as suas obras.
Mesmo com essa possibilidade indicada, Márcio Cammarosano, doutor em Direito e especialista em Direito Público, pede cautela. Segundo ele, a lei de licitações e contratos diz que o pedido de recuperação em si não possibilita a rescisão por parte da administração contratante, ao contrário do que ocorreria em caso de falência, quando o contrato é anulado. “O processo [de recuperação] pode ser bem sucedido, mas enquanto isso os contratos firmados, se forem legais, devem ser mantidos.”
Caso a situação financeira da empesa acarrete alguma dificuldade ou inadimplência contratual, prossegue, a administração precisaria apontar dados concretos que a autorizem a afirmar que invariavelmente a empresa não cumprirá o acordado. “Apenas a presunção não justifica uma rescisão.” Entretando, devido à exposição e a gravidade do caso, Cammarosano acredita ser natural um movimento do poder público para reexaminar os processos de contratação e verificar se tudo está correto. “Podem também acompanhar mais de perto a execução do contrato para ver esses problemas estão afetando o desempenho da empresa.”
De acordo com os analistas, se contratos da Delta com o poder público forem rompidos por culpa da empresa há a previsão de uma série de sanções. Entre elas, multas por inexecução e suspensão para contratos públicos, geralmente de dois anos, e até a declaração de inidoneidade. “No fim, a CGU pode nem precisar declarar a inidoneidade. Isso pode acontecer pelas autoridades máximas do governo em que um contrato foi firmado”, conclui Stroppa.
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