Claudio Spanos na Praça do Relógio, na Cidade Universitária, em São Paulo (Foto: Raul Zito/G1)
Nos últimos 26 anos, o vestibular mais concorrido do Brasil convocou Claudio Pace Spanos nove vezes para a segunda fase. Na segunda-feira (19), lá estava ele novamente, dessa vez entre os 31.503 candidatos que ainda têm uma chance de passar na Fuvest 2012.
Muitos podem considerá-lo um "craque" da segunda fase, já que foi aprovado em sete das oito provas de conhecimento específico que realizou. Mas Claudio, hoje com 48 anos, se diz realista e não nutre muitas esperanças de conseguir nota suficiente nos exames dos dias 8, 9 e 10 de janeiro e se matricular na Universidade de São Paulo (USP) no ano que vem.
O motivo, segundo ele, é a alta competitividade atual entre os candidatos. "As notas são muito altas, tem gente há cinco anos estudando para prestar medicina, hoje é muito difícil", afirmou.
Foi justamente no ano passado, prestando medicina, que Claudio perdeu sua invencibilidade como vestibulando da Fuvest. Mesmo assim, ele decidiu tentar novamente, dessa vez com maior dedicação: desde maio faz cursinho e, em agosto, abandonou a carreira de 15 anos na advocacia para se dedicar à vida de vestibulando - que, em termos quantitativos, seria sua segunda profissão mais duradoura.
O histórico de Claudio Spanos na Fuvest
ANOCARREIRARESULTADO1985 medicina na Escola Paulista de Medicina foi aprovado, mas não cursou
1986 medicina na Faculdade de Medicina foi aprovado e cursou parcialmente
1987 cinema foi aprovado e cursou parcialmente
1992 odontologia foi aprovado e cursou parcialmente
1995 direito foi aprovado e concluiu o curso
2000 letras foi aprovado e cursou parcialmente
2010 letras foi aprovado, mas não cursou
2011 medicina na Faculdade de Medicina não passou na segunda fase
2012 medicina na Faculdade de Medicina passou para a segunda fase, que acontece em janeiro de 2012
Começo tradicional
Fruto de uma mistura entre inteligência, curiosidade, esforço e inconformismo, a relação de Claudio com a Fuvest começou da maneira mais tradicional possível: quando terminava o colégio, o então adolescente se inscreveu no vestibular. Foi aprovado de primeira.
"Mas era na Escola Paulista de Medicina, e minha primeira opção era a Faculdade de Medicina da USP, em Pinheiros, então decidi fazer um ano de cursinho." Na Fuvest 1986, ele foi novamente aprovado, desta vez onde queria estudar.
No ano seguinte, Claudio tentou o vestibular para cinema e foi aprovado pela terceira vez consecutiva.
Na época, a USP permitia que um estudante estivesse matriculado em dois cursos ao mesmo tempo, por isso, ele passou alguns anos entre as duas carreiras. "Mas acho que na época eu não tinha maturidade, não estava a fim de estudar."
Cansado da vida dupla de universitário, ele abandonou os dois cursos e decidiu se mudar para a Califórnia, nos Estados Unidos, onde viveu durante cerca de dois anos.
Incentivo
De volta ao Brasil, mas ainda sem a certeza de que as aulas de medicina eram o que queria, Claudio foi incentivado por um amigo cirurgião plástico, com quem trabalhava na época, a cursar odontologia para seguir no ramo, na área de cirurgia facial.
Mesmo após cinco anos longe dos livros, ele passou pela quarta vez na USP, na Fuvest 1992. "Naquela época eu tinha que ir ao jornaleiro para ver o resultado", lembrou.
Estou sempre me reciclando. No fundo é tudo um processo. Acho que a questão é não se acomodar"
Claudio Spanos, vestibulando de medicina
No curso de odontologia, Claudio durou três anos, mas sabia que não seria feliz seguindo a carreira. Para ele, rumos profissionais nem sempre acontecem como planejado, e por isso se recicla tanto "No fundo é tudo um processo. Acho que a questão é não se acomodar."
A guinada seguinte em sua vida também esteve vinculada à Fuvest. Deu certo, e ele, já com 30 anos, virou calouro da Faculdade de Direito da USP.
Aos poucos, ele foi se tornando um exemplo não só de que nunca é tarde para recomeçar, mas também de que, em nome da felicidade e da realização pessoal, também é possível recomeçar mais de uma vez.
Nos mais de dez anos seguintes, muita coisa se passou na vida de Spanos. Uma delas foi a conquista de seu primeiro e, por enquanto, único diploma de graduação. Enquanto construía sua carreira como advogado autônomo criminal e civil, ele se casou, comprou uma casa e tomou uma decisão muito comum entre os ex-uspianos: prestar vestibular para uma segunda graduação para manter o vínculo com a universidade.
Ele escolheu um curso diferente (letras), mas obteve o mesmo resultado positivo. Claudio chegou a cursar um ano da carreira, mas acabou não conseguindo conciliar os estudos e o trabalho.
Formado em direito, Spanos já cursou
medicina, cinema, odontologia e letras
(Foto: Raul Zito/G1)
Com o passar do tempo, porém, ele voltou a se sentir insatisfeito e viu crescer sua vontade de mudar de vida novamente, dessa vez de maneira mais madura e estabilidade financeira que nos anos 80.
Recomeço inusitado
Ao ver seu desempenho no vestibular para letras da Fuvest 2010, ele se animou a um desafio maior. "Prestei a Fuvest e fui muito bem, então eu falei: 'se eu estudar, posso entrar em uma coisa que eu goste mesmo'." Foi assim que, mais de 20 anos depois, ele voltou então à primeira carreira que decidiu cursar, mas sem qualquer arrependimento ou sensação de tempo perdido.
Na Fuvest 2011, os 71 pontos que Spanos fez na primeira fase passaram rentes à nota de corte, e as perguntas sobre os livros do vestibular fizeram com que ele fosse reprovado pela primeira vez. Neste ano, ele se matriculou e passou a se dedicar exclusivamente ao vestibular.
O esforço acadêmico, aliado à maturidade e ao auto-conhecimento, tem valido a pena. Claudio acabou acertando 168 questões no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), 77 das 89 questões da Fuvest e 80 das 90 questões da Unesp. Ele também prestou a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
O Brasil é um país em que falta médico. Se tiver opção de ir para uma cidade menor, eu iria para essas comunidades que realmente precisam de médicos"
Claudio Spanos
Sem filhos, separado e sem a necessidade de construir um currículo do zero, Claudio não vê o diploma com os mesmos olhos da maioria de seus concorrentes recém-formados no ensino médio. Se não passar na USP, ele quer usar a nota do Enem para estudar "em qualquer cidade de praia", como a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Inspirado por "médicos muito bacanas" que conheceu, como um professor da USP "fantástico, ético e com amor à profissão", Cláudio quer exercer a medicina em regiões brasileiras com defasagem de profissionais de saúde.
"Acho que o que importa é dar um jeito de colaborar de alguma maneira, não dá para estar aqui de férias. A maioria é contrário, é gente que está atrás de dinheiro."informações G1.