Obama decaiu da promessa de fundação do Estado palestino no prazo de um ano, mantidas as fronteiras de 1967, e pode constatar ter o premier israelense, Benjamin Netanyahu, feito ouvidos de mercador às advertências para impedir assentamentos em terras palestinas. No particular, a Obama nunca faltaram informações dos 007 da CIA de que Netanyahu virou marionete do ultradireitista Avigdor Lieberman, fomentador de assentamentos e da apropriação total de Jerusalém. Lieberman é líder dos judeus russos que desembarcaram às pencas em Israel, virou ministro de Relações Exteriores e preside o partido Israel Beitenu (Israel Nossa Casa), que funciona no Parlamento como fiel da balança na manutenção de Netanyahu como premier.
Pela tribuna da ONU e sobre a questão palestina passaram personagens que empolgaram. Em 1974, e com o inseparável turbante árabe (kafieh), o falecido Yasser Arafat fez um discurso histórico a comover a opinião pública. Num fantástico golpe de cena, Arafat levantou um ramo de oliveira, símbolo da esperança, e pediu a todos os povos que o ajudassem a não deixá-lo cair. Ao mesmo tempo, encostava a mão livre no coldre de revólver amarrado à cintura, a revelar que lutaria até a morte pela causa palestina.
À época, Arafat contava com o apagado burocrata Mahmoud Abbas, apelidado Abu Mazen, como segundo na hierarquia. Não com as luzes de Arafat e sempre engravatado nos encontros internacionais, conseguiu Abbas sair vitorioso na assembleia deste setembro ao trocar a tutoria dos EUA pela parceria das Nações Unidas. Com a formulação do pedido de reconhecimento do Estado palestino, voltou a colocar a questão no centro das atenções. Mais ainda: reconquistou uma liderança que, apesar de recente acordo com o Hamas, estava em queda livre. Como consequência da nova geopolítica do mundo árabe, Abbas conquistou, na ONU e para a Palestina, um status de observador especial, exatamente igual ao do Vaticano. O sucesso de Abbas incomodou o premier de Israel, que reagiu da pior forma na terça-feira 27. Netanyahu deu sinal verde para novos assentamentos em Jerusalém Oriental, em mais um ato de apossamento de terras palestinas
Depois de assistir à vitória de Abbas e sentir os anseios libertários portados pela Primavera Árabe, foi a vez de o soberano saudita fazer promessas de mudanças, num país onde vigora a pena de morte. No fundo, o rei Abdullah bin Abdul Aziz al-Saúd, de 87 anos, no poder desde agosto de 2005, partiu para uma abertura enganosa. Prometeu reconhecer às mulheres maiores de 21 anos o direito de votar e ser votadas. Mas isso só em 2015. Portanto, as mulheres não participaram das eleições administrativas da quinta-feira 29. Como se sabe, na Arábia só existem eleições para cargos municipais.
Como 2015 ainda está longe, o soberano avisou que, a partir de 2013, escolherá mulheres para compor seu conselho consultivo, de 120 integrantes. Sobre as promessas, num país- onde a esposa é submetida ao poder marital, protestou, via internet, a ativista Iman al-Qahtani: “Não estou contente. Foi muito pouco anunciar que em três anos as mulheres poderão ser nomeadas para o conselho, o Majlis al-Shura, e que poderão votar e ser votadas nas eleições municipais daqui a quatro anos. E a proibição de dirigir veículos, sob pena de chibatadas impostas pela Justiça, e de viajar e trabalhar no exterior sem precisar de autorização do marido?” As reformistas querem igualdade de direitos, liberdade de expressão, uma assembleia eleita, reforma judiciária e liberdade para os presos políticos. Pelo seu lado, o soberano conforta-se com as pesquisas que apontam para uma maioria conservadora.
A maior fonte de preocupação de Abdullah não são as mulheres, mas a Al-Qaeda, ainda que sem o saudita Osama bin Laden. A Al-Qaeda fortaleceu-se quando o rei aceitou a presença de tropas norte-americanas para ajudar a manter a segurança nos poços petrolíferos: a CIA informava Abdullah sobre uma iminente invasão iraquiana por Saddam Hussein. Como o rei é responsável pela custódia dos lugares santos (Meca e Medina), a presença norte-americana foi vista como violação ao solo sagrado. Assim, a Al-Qaeda cresceu em importância e recebeu aporte financeiro de sauditas fundamentalistas.
Sobre proibir mulheres de dirigir veículos, Abdullah diz que novas regras virão com o tempo. Como ele é wahabita, poderia recordar que Aisha, dada como a esposa perfeita de Maomé, dirigia o camelo que servia ao maridohttp://www.cartacapital.com.br/internacional/os-gritos-nao-foram-silenciados.
Wálter Maierovitch
Walter Maierovitch é jurista e professor, foi desembargador no TJ-SP