Ah, esses jogadores…
Lembro-me de uma derrota das mais doídas que sentimos, quando fomos eliminados pela Nigéria em uma Olimpíada. Perda muito importante e inesquecível, já que ainda não conseguimos este título. Naquele tempo, os africanos eram ossos duros de roer. Jogavam bem, batiam mais ainda e se afirmavam como estrelas em ascensão. Mas hoje os times africanos perderam sua magia. Pois vejamos os mundiais de menores: onde estão os africanos que, por tanto tempo, formam protagonistas? Dizia-se até, com a malícia que nos é característica, que eles formavam equipes de “gatos”, isto é: jogadores que diminuíam a díade para terem supremacia física contra os adversários imberbes.
Talvez por contágio ou castigo, hoje eles apresentam um jogo burocrático e triste. Perderam a ingenuidade e, por consequên-cia, sua maior qualidade: a irreverência. Assim se tornaram presas fáceis para seus adversários. Uma pena que eles, assim como os brasileiros, tenham se afastado de suas raízes; tenham abdicado de suas culturas, pois assim se afastaram do que possuem de mais belo e natural. Mas não foram eles que perderam, e sim o futebol como muitos de nós gostamos; um futebol baseado na plena expressão humana corpórea e emocional. Um futebol em que a beleza plástica promove verdadeiras revoluções, permitindo que o menor e mais fraco possa vencer.
Por falar em equipes de menores, a nossa seleção tem bons valores, alguma qualidade individual, mas pouco conjunto e quase nenhum comprometimento coletivo, epidemia que crassa em nosso futebol, já que parece que todos querem chamar todas as atenções para si. Além disso, parece-me que não há um comprometimento com a questão profissional; não há cuidados com o trabalho que exercem, como se a situação atual fosse eternizada com o que existe no momento. Talvez o tratamento que lhes é dado ultrapasse o limite da coerência, da educação de boa qualidade e do respeito ao que já foi conquistado. Jogar fora talento não é prerrogativa dos brasileiros, mas aqui este desperdício é muito mais claro que em qualquer outro ponto do planeta. Ou vocês acham que um inglês, um francês, um africano ou um italiano tratariam o trabalho e o emprego como se fosse obrigação do sistema?
Um atleta do São Paulo saiu a público para falar da possível fragilidade da defesa do Tricolor em razão da falta de especialistas. Em primeiro lugar, essa postura me parece muito mais uma defesa indevida e oportunista do que uma -realidade. É que quando um jogador cita especialidade como uma qualidade em futebol, ele está minimizando as habilidades e restringindo as possibilidades que se apresentam em determinadas situações de jogo. Se tenho um defensor com a oportunidade de definir uma partida com um gol, por que não fazê-lo? Só porque é um “especialista” ele deve se ater a fazer só uma determinada função? É claro que não; e esta é uma das principais características deste esporte tão democrático, já que permite velozes e lentos, gordos e magros, altos e baixos dividirem o mesmo espaço. Essa é uma clara demonstração do quanto nossos jogadores entendem de futebol e de como eles se protegem da opinião pública.
Outro atleta da mesma equipe também resolveu entrar na polêmica criada sobre a transferência ou não dos jovens craques santistas. Acha ele que os meninos deveriam ir para a Europa para adquirir experiência internacional, mostrando que, em sua opinião, sem isso jamais crescerão o suficiente. Esta é mais uma das verdades que se vendem indiscriminadamente aos que acompanham futebol no Brasil, como se o fato tivesse a relevância que seus autores apregoam. Não creio, pois o talento não necessita de determinadas influências fenotípicas para florescer. Acredito que, mais que entenderem assim, alguns falam disso como uma forma de relembrar a todos que, como eles jogaram muitos anos fora do Brasil, foram – ou ainda são – mais importantes que outros, que estão aparecendo. Uma tentativa desesperada de autovalorização que tentam deixar subentendida. Os garotos do Santos podem e devem ficar por aqui. Será melhor, já que estarão cercados por quem deles gosta e terão mais felicidade para desenvolverem suas qualidades técnicas. Não existe hoje uma razão específica que os faça entender da precisão de atravessar oceanos para serem considerados como profissionais diferenciados e humanamente a permanência deles só pode acrescentar o melhor e mais importante valor que poderiam ter acesso.