O tiro saiu pela culatra


Cada vez mais pessoas buscam clubes para atirar e comprar armas, na contramão das campanhas do governo. Foto: Débora Klempous
O professor de física Evandro abi Saab sempre teve paixão por armas de fogo. “Só não sabia que podia ter uma, porque a mídia bloqueia isso da gente”, diz, olhar fixo, os músculos projetando-se sob a camiseta. Mas quando três ladrões armados invadiram a casa da família, com todos dentro, a sensação de impotência por não poder “fazer nada” foi tamanha que Saab buscou saber como adquirir uma arma para “defesa pessoal”. E descobriu. Fez um curso básico em um clube de tiro e passou a atirar. “Uni o útil ao agradável. Vim aqui para poder me defender e me apaixonei pelo esporte.” Ele trouxe pai, mãe, irmão e irmã, todos médicos. “Minha mãe achava que arma era coisa de bandido. Depois de atirar, não queria sair do estande. Ela até disse: não dá para comprar um calibre maior?” Será uma Glock .380 a segunda arma da família.
Não é difícil vencer o que os amantes de armas definem como “uma das mais duras legislações do mundo”. Basta um -pouco de dinheiro e zero experiência para fazer disparos em um clube de tiro prático. Custa 350 reais o curso de dois dias; depois, 2 reais a bala. Não precisa de registro, teste, nada. Mas nem só de lazer e esporte vivem os clubes de tiro. Eles têm sido a saída para uma crescente leva de cidadãos em busca de armas. É um universo fechado em que, à margem das campanhas de desarmamento, debate-se o modelo de .38 a ser adquirido com auxílio do despachante especializado, enquanto se discute na internet sobre o inalienável direito à defesa pessoal.
Não à toa, a procura cresce. Alguns clubes registram aumento de até 500% na procura nos últimos anos. Segundo o Exército, responsável por fiscalizá-los, em 2004 havia 14 clubes de tiro prático registrados no Brasil. Hoje são 534. A corporação diz que o Estatuto do Desarmamento, aprovado no fim de 2003, originou uma corrida de legalização de clubes, mas não nega o expressivo aumento no número deles, nem na procura por eles. “Os números falam por si”, diz o coronel Aquiles Santos Jacinto Filho, da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército.*